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Matrizes da Composição Dramatúrgica

As grandes deusas-mãe são representadas como vasos sagrados, pois são as senhoras das águas superiores e inferiores. Nos mistérios do mundo feminino, o vaso é a representação do corpo e está ligado ao mistério da transformação que ocorre no interior do corpo da mulher. E há as águas que saem do útero da terra. A mulher é essencialmente feita de água. As águas superiores são o leite, como a chuva sagrada que flui no seio da Grande Mãe, da parte superior do seu corpo. O seio é um símbolo feminino da maternidade: o vaso como local da continência, nutrição, aconchego, proteção e cuidados. A experiência do arquétipo feminino como seio nutridor aparece largamente representada na arte de todos os povos, principalmente no motivo de vasos de cerâmica com seios.

(Cavalcanti, Raissa. Mitos da Água. SP: Cultrix, 1997. Pg. 166)

Salve o feminino nas águas dos Mar!
As emoções no vai e vem das ondas
Luz branca de espuma
E o véu azul-atlante que veste
Ornado de estrelas e conchas
E de pérolas inventa em si o Luar
Perfume de rosas brancas e maresia
Que desenha toda a fantasia
No vento do Amor que traz
Convida ao mergulho a sereia
Pra brincar além da areia.
(Sophia Christou)

"...Água um leite inesgotável, o leite da natureza Mãe...
valorização que marca a água com um cunho profundamente feminino.
... Dos quatro elementos, somente a água pode embalar.
É ela o elemento embalador.
Este é mais um traço de seu caráter feminino: ela embala como uma mãe.
 ... A água leva-nos. A água embala-nos. A água adormece-nos.
 A água devolve-nos a nossa mãe."

(BACHELARD, Gaston. A água e os sonhos. SP: Martins Fontes, 2002. p. 136)

A agua é regida pela lua. As marés oceanicas sao diretamente afetadas pelas fases da lua. As marés altas sao diretamente afetadas pelas fases da lua. As mares altas e baixas talvez sejam a reaçao mais visível à lua, mas onde quer que haja vida existe um vinculo com o movimento desse astro. O ciclo reprodutivo da mulher está em sincronia com o da lua. Faz sentido que a maioria das culturas da Antiguidade medisse o tempo com base no calendário lunar. Esse calendário, que está intimamente ligado ao ciclo da vida, foi um importante instrumento da agricultura. Quando o nosso ritmo está em sintonia com o movimento da lua, é mais fácil sincronizar o fluxo da água que existe dentro de nós. Isso nada mais é do que viver a vida conforme a batida do tambor tocado pelo ritmo da natureza.

(EMOTO, Masuru. A vida secreta da água. SP: Cultrix, 2006, p. 39).

Quando menina, eu carregava água na peneira.
Era o mesmo que roubar um vento e sair correndo com ele para mostrar pros meus irmãos.
Era o mesmo que criar peixes no bolso.
Minha mãe reparava com ternura.
Um dia, ela me disse: Minha filha, você vai ser poeta.
Você vai carregar água na peneira a vida toda.
Você vai encher os vazios com as suas peraltagens.
E algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos.
(Manuel de Barros)

LUA DE TABRIZ
Com a maré da manhã surgiu no céu uma lua.
De lá desceu e fitou-me.
Como o falcão que arrebata o pássaro,
Essa lua agarrou-me e cruzou o céu.
Quando olhei para mim, já não me vi:
Naquela lua meu corpo se tornara, por graça, sutil como a alma.
Viajei então em estado de alma e nada mais vi senão a lua.
Até que o segredo do saber divino me foi por inteiro revelado:
As nove esferas celestes fundiram-se na lua
E o vaso do meu ser dissolveu-se inteiro no mar.
Quando o mar quebrou-se em ondas,
A sabedoria divina lançou sua voz ao longe.
Assim tudo ocorreu, assim tudo foi feito.
Logo o mar inundou-se de espumas,
E cada gota de espuma tomou forma e corpo.
Ao receber o chamado do mar, cada corpo de espuma se desfez e  tornou-se espírito no oceano.

(Rumi)

Muito brabo aquele ano de seca.
Vinte léguas em redor, contam: só restava aquela pocinha dágua:
Lama quase. Metro de Redondo. Palmo de fundura.
O mundo meu é pequeno, Senhor.
Tem um pequeno rio e um pouco de árvores.
Nossa casa foi feita de costas para o rio.
Nos fundos do quintal há um menino e suas latas maravilhosas. Seu olho exagera o azul.
Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas com aves.
Formigas recortam roseiras da avó.

(Manuel de Barros)

Eu queria ser banhada por um rio como um sítio é.
Como as árvores são.
Como as pedras são.
Eu fosse inventada como as pedrinhas e as suas rãs em minhas areias.
Eu escorresse pelas grotas e pelos cerrados como os rios.
Sem conhecer nem os rumos como os andarilhos.
Livre. Livre é quem não tem rumo.

(Manuel de Barros)

O rio que fazia uma volta atrás de nossa casa era a imagem de um vidro mole que fazia uma volta atrás de casa.
Passou um homem depois e disse: Essa volta que o rio faz por trás de sua casa se chama enseada.
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro que fazia uma volta atrás de casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.

(Manuel de Barros)

​Kosmofonia MBYA Guarany​

Ouvi os cantos, a voz, os murmúrios
dos MBYA Guaranis. Eles me transportaram
para a fonte das palavras. Me levaram
para os ancestrais, para os fósseis
linguisticos, lá onde se misturaram
as primeiras formas, as primeiras
vozes: A voz das águas, do sol, das
crianças, dos pássaros, das árvores
das rãs… Passei quase duas horas
deitada nos meus inícios, nos
inícios dos cantos do homem.
(Manuel de Barros)

 

Tupã Tenondé: A criação do Universo, da Terra e do Homem segundo a tradição oral Guarani, de Kaka Werá Jecupé​

Mitã oiko ãguã ma, Ñamandu Ru Ete, Jakaira Ru Ete, Karaí Ru Ete ogueroñemongeta ma yvy rupáre guemimoñe’eng
Oguero-chareko ma ñe’eng o chy rã i re, guú rã i re.

Para nascer uma criança o Grande Espírito, Jakaira Ru Ete, Karaí Ru Ete discorreram essas orações sagradas sobre a morada terrena com aqueles que haviam provido de palavra.
Desdobraram esquadrinhando almas, tecendo aqueles que seriam futuros pais e mães.

A rire ma, Ñamandu Ru Ete, Karaí Ru Ete, Jakaira Ru Ete:
“Cheé, che ra’y namondo-uka véiri ma va’erã; namboapyka véiri ma va’erã.”

Então os Seres-Trovões disseram:
“Nós e nossos filhos seremos revolvidos pela Terra e nesse revolver proveremos palavras em pé pelo chão.
Sons andantes cantarão vidas, cada qual seu tom.”

...Grande vaso maternal, o útero cósmico, aquoso receptáculo de energias poderosas, o lugar dos nascimentos, das grandes transformações. Na sua qualidade de água maternal, Téstis não é só o útero que dá origem e para onde tudo retorna, mas é também o grande seio cósmico que alimenta, a grande fonte nutridora universal.

(Cavalcanti, Raissa. Mitos da Água. SP: Cultrix, 1997. Pg. 166)

FLOR DAS ÁGUAS

Fonte de todas as fontes.
Senhora dos Rios, das cachoeiras, das correntezas e manguezais.
Rainha do Mar, Princesa do ar que traz a chuva, regando as plantas, alimentando os seres com teu leite sagrado.
Força das tempestades, traz a nós a purificação, a limpeza, a renovação.
Nos faz navegar em tuas águas de sabedoria, faz de mim sua Sereia a trazer boas novas nos cantos da Terra.

(Ieda Moraes Takaya)

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